Mesa diretora do IHGT

24.5.13

Mestre da Igreja de São Evangelista de Tiradentes


A igreja de São João Evangelista, em Tiradentes, teve sua construção arrastada durante toda a segunda metade do século XVIII, tendo sido aberta ao culto em fins do setecentos, provavelmente. E é dessa época que data o conjunto de imagens sacras desse tempo, que congregava a irmandade do orago, que era dos pardos, além das confrarias de Nossa Senhora das Dores e São Francisco de Assis, esta também dos pardos. 

S. João Evangelista, madeira dourada e
policromia. Ultimo quartel do séc. XVIII.


Trata-se de um calvário de grandes proporções (mais de dois metros de altura) que ocupa o camarim do retábulo do altar-mor: Crucifixo, Nossa Senhora e São João Evangelista; as imagens de Santa Cecília e Santa Catarina de Alexandria, nos nichos laterais; Nossa Senhora das Dores, do altar colateral do lado do Evangelho, e Nossa Senhora dos Remédios, no altar do lado da Epístola. Todas as imagens têm as mesmas características estilísticas e podem ser atribuídas a um único escultor.



N. Sa. das Dores, madeira policromada
e tecido (roca), 1801.

As figuras têm o corpo cheio, com cintura alta, braços roliços, mãos com dedos longos, embora bastante adiposos, e com articulações bem marcadas. Os rostos são ovais, com fronte larga, nariz triangular com narinas recortadas, olhos pequenos e amendoados, sobrancelhas em linha pouco arqueadas, boca minúscula com lábios finos e queixos em montículos bem pronunciados; os pescoços sempre curtos e torneados. As cabeleiras são vastas, com mechas de estrias grossas, caindo lateralmente e, por vezes, fazendo um topete sobre a fronte, como é o caso de São João Evangelista. Os pés são sempre colocados em ângulos bem abertos, distanciados. 


Santa Cecília, madeira dourada e policromia.
Último quartel do séc. XVIII. 


O planejamento bastante exuberante contrasta com a ingenuidade das feições. Todas as vestes caem em pregas verticais na frente, formando um ângulo nas costas, com uma ponta sempre à altura dos joelhos, em dobra curta, numa tentativa de dinamizar a peça.  As imagens têm certo ar de delicadeza rococó, nada pesadas e sem a dramaticidade barroca. As três santas menores, Cecília, Catarina e Nossa Senhora das Dores têm rica policromia a têmpera sobre o douramento total, com tratamento de esgrafito, punções nas barras e arremate em renda de linha enrijecida com cola e dourada.  Sobre os fundos pontilhados, estriados, ou em ziguezague, aparecem ramos de flores verdes, vermelhas e azuis, soltas aleatoriamente. As carnações são de um rosa muito carregado. Outro detalhe do planejamento existente nas peças é uma faixa de tecido retorcido, à maneira de cinto, com um laço na frente, descentralizado. Os marmorizados das peanhas, em tons vermelhos e amarelos, são um tanto curiosos e de gosto popular. As duas imagens do calvário, que são o evangelista João e a Virgem, têm os planejamentos em cortes mais largos, os cabelos em mechas mais altas, devido à proporção exagerada das peças. A policromia nesse caso é um tanto pobre, em tons chapados, com reservas de ouro para os detalhes em losango, estrelas e flores. Os dois crucifixos têm as mesmas características das imagens vestidas, mas com musculatura pouco detalhada, pernas e troncos torneados e cheios, carnação muito rosada com poucas chagas e pouco sangue.  As duas imagens de roca, Nossa Senhora das Dores, processional, e Nossa Senhora dos Remédios, têm a mesma expressão facial das demais peças, e os cabelos curtos e simplificados, para serem cobertos com cabeleira natural. Nossa Senhora das Dores tem estrutura de seis ripas revestidas e tecido grosso, com pés esculpidos e calçados de sandálias, assim como eram os de Nossa Senhora dos Remédios, embora esta última tivesse pernas semi-esculpidas e uma madeira ligando o busto à peanha. Ainda se pode incluir nesse conjunto uma imagem de roca, de Nossa Senhora ajoelhada, sendo coroada pela Trindade, pertencente à Irmandade de Boa Morte da Matriz do Pilar, de São João del-Rei.


        
N. Sa. das Dores, policromia perdida.*
Último quartel do séc. XVIII.


Esse conjunto de imagens tem certa semelhança com o conjunto de imagens dos Sete Passo da Paixão existente na Igreja Matriz de Santo Antônio, datado de 1793 e de autoria de certo Antônio da Costa Santeiro que também é autor dos anjos trombeteiros do órgão da Matriz ,datados de 1788. Sobre as peças da Igreja de São João Evangelista, até o momento não foi localizada nenhuma documentação que possa elucidar a autoria e datas exatas.


Santa Catarina de Alexandria, madeira dourada e
 policromia. Último quartel do séc. XVIII.


____________
*  Peça furtada em 1994 e mantida enterrada por um ano e recuperada em 1996
 OLINTO RODRIGUES  DOS SANTOS FILHO
 Artigo publicado originalmente no Boletim do CEIB ,Belo Horizonte,n. 4,set.,1977, 1-2