Autor: Olinto
Rodrigues dos Santos Filho
Embora grande parte ou
a maioria esmagadora das construções do núcleo histórico de Tiradentes date do
século XVIII e XIX, algumas casas setecentistas ou oitocentistas passaram por
reformas superficiais ou uma espécie de “maquilagem” para dar um ar mais
atualizado as velhas construções. Em sua maioria acrescentou-se uma nova
cimalha, sobrevergas alteadas, detalhes de “vistas” das ombreiras e vergas de
janelas e portas em argamassa.
Na rua da Câmara
podemos citar primeiramente a casa de José Batista de Carvalho - “Sô Zequinha”
– que teve a reconstrução de uma cimalha perfilada de gosto eclético (n° 03), a
casa de Regina Conceição (n° 16) que teve a altura da fachada aumentada,
introdução de faixa decorativa acima das sobrevergas, porta foi deslocada para a lateral e as quatro
janelas da frente tiveram os aros substituídos por modelo mais verticalizado e
com sobrevergas alteradas, com detalhe de argamassa. Possivelmente foi
aumentado um vão. Hoje o telhado e fachada foram novamente rebaixados.
Ainda na mesma rua,
(número 08), o caso mais radical é da casa de Joaquinzinho Ramalho, em que
todos os aros de portas e janelas foram retirados e introduzidos guarnições
internas, sendo a frente preenchidas com “vistas” de massa apresentando
detalhes ecléticos. As folhas das portas e janelas foram substituídas por
portas do tipo calha usual no século XIX e início do XX. Foi ainda introduzida
uma cimalha perfilada, muito detalhada assim como os cunhais vazados. É curioso
que a porta secundaria que dá para rua Padre Toledo continua original, de
saia-camisa, com socos de pedra e portais maciços.
A casa de Vicente Guerra,
(número 58), passou por reforma nos cunhais e a beira seveira foi substituída
por uma cimalha perfilada.
Na rua Direita, número
40 a casa, teve sua fachada reformada na década de 1910/20, mas manteve as
janelas e portas antigas, só acrescentando sobrevergas alteadas e introduzindo
cimalha perfilada de gosto eclético.
Em 1921, foi construída
sobre alicerces antigos uma pequena oficina de ourives de Galdino Rocha, com
fachada de gosto eclético, duas janelas frontais e entrada lateral. Tanto nos
cunhais como nos embasamentos existem almofadas e molduras. As molduras das
janelas descrevem losangos. O entablamento em cimalha e pequena moldura
sustentam o frontão ou empena, com almofadas, círculo com monograma do
proprietário (GR), terminado em curva decorado com três pinhas de cerâmica. É
curioso que o telhado continuou em telha canal enquanto a cobertura do frontão
é em telha marselhesa. Hoje o sentido da cumeeira foi invertido, ficando
paralela a rua.
Ainda na rua Direita, o
sobrado que pertenceu a Eloisa Hellow, teve o beiral decorado com lambrequins.
Esta casa ruiu na década de 1950 e foi recentemente reconstruída, sendo hoje a
Pousada Padre Toledo.
Na rua Padre Toledo,
existe um sobrado colonial, de número 76 em que toda fachada foi refeita ao
gosto eclético, inclusive com a introdução de um portão lateral de ferro. No térreo
e três vãos com verga de volta inteira, com molduras de argamassa. Os vãos se
repetem na parte superior com sacadas entaladas com gradil de ferro e uma
cimalha muito detalhada coroa a fachada. Internamente manteve-se o aspecto
colonial. Nas fachadas laterais foram abertos os vãos de ventilação e
iluminação com verga em ângulo agudo, lembrando o neogótico. Esse sobrado que
ultimamente pertenceu a Arquiconfraria da Santíssima Trindade era pintado em
amarelo com relevos claros e após a última reforma foi pintado de rosa forte,
um tanto destoante do conjunto.
Ainda onde é a pousada
Richard, número 124, existiu uma casa mais baixa e menor com entrada
lateral e frontão triangular, com molduras de gosto eclético, demolida por
volta de 1966, para dar lugar a construção de um pastiche de colonial com águas
furtadas e janelões desproporcionais, tudo em cimento. A casa construída por
Paulo Boujanic destoa do conjunto urbano, seja pelas aguas furtadas, seja pelas
proporções.
Em 1917 a Câmara
Municipal de Tiradentes recebeu em doação de Policarpo Rocha, o prédio da casa
do Padre Carlos Correia de Toledo Melo (1731/1803) e para lá transferiu a sede
da Câmara e Agência Executiva, depois de 1930 a Prefeitura. Lá também se
instalou um salão para festas, bailes, teatros e cinema. Nessa época a câmara
promoveu uma reforma que na verdade reduziu-se ao sobrado (torreão) construindo
um frontão eclético com beirais em lambrequins e agulha central. As janelas
foram deslocadas para ficaram equidistantes e introduziu-se vidraças de abrir
para fora, com vidros maiores semelhantes a Estação da Estrada de Ferro Oeste
de Minas (EFOM). Sobre as janelas do sobrado haviam sobrevergas alteadas, uma
cimalhinha delimitando a empena e ao centro um círculo com as iniciais em massa
CM (Câmara Municipal). Ainda foi aberto uma porta lateral e construída uma
escada em tijoles queimados e cimento, com corrimão de ferro. A entrada da
Câmara era independente do cineteatro, que se fazia pela porta original. Foi
nesse momento que os paus-a-pique das paredes do sobrado foram substituídos por
tijolos maciços e a parte inferior encamisada com os mesmos tijolos. No portão
principal à direita foram colocadas compoteiras de cimento sobre os pilares.
Sobre cada janela foi colocado um braço de latão com tulipa de vidro para
iluminação externa, também foram abertas ventilações sobre o piso feitas com
manilhas de cerâmica executadas na Cerâmica Progresso de Alberto Paolucci. O
prédio foi pintado de cor próximo ao rosa, com os cunhais, aros das janelas e
relevos em branco, para dá um aspecto eclético ao prédio. Em restauração feita
pelo SPHAN, em 1944 o prédio voltou a sua feição original.
Voltando a rua da
Câmara e Chafariz vamos ainda encontrar uma intervenção eclética na fachada do
número 88, quando a porta principal foi levada para a lateral e as três janelas
tiveram as ombreiras, vergas e peitoris substituídos por molduras de argamassa,
com sobrevergas alteadas e construção de cimalha perfilada, obra feita entre
1910 e 1920.
O número 54 da rua do Chafariz,
de fronte para o Largo do Ó, uma casa colonial recebeu tratamento semelhante na
fachada, agora com construção de platibanda almofadada e falsos portais de
massa sobre os de pedra. Essa casa entrou em ruina e foi reconstruída a partir
de croqui feito pelo arquiteto Sylvio de Vasconcellos (1916-1979), então Chefe
do 3° Distrito do DPHAN em Minas Gerais e até hoje mantem a fachada fruto da
reforma, com exceção das treliças introduzidas nos anos 1980.
Realmente construídos
em estilo eclético foram o prédio da Estação da Estrada de Ferro Oeste de Minas
(EFOM) em 1880/1881; o Chalé do Padre João Batista Fonseca, na atual rua
Ministro Gabriel Passos (Praia) e a casa de Estevão Martins, na antiga rua do
Areão, atual Inconfidentes n° X.
O chalé do Padre João Batista da Fonseca foi construído nos últimos anos
do século XIX, em um grande terreno, “na praia”, antes logradouro público, as
margens do Ribeiro Santo Antônio. A planta é simples, descrita em retângulo,
com duas salas (visita e jantar) a direita e os quartos a esquerda, tendo aos
fundos a cozinha e despensa. A fachada sobre embasamento alto apresenta quatro
janelas verticalizadas com detalhes e molduras em argamassa, com vidraças de
grandes caixilhos e um frontão triangular tendo no vértice e extremidades
agulhas de cerâmica. A entrada se faz pela entrada lateral com degraus de
cimento, hoje por pequeno alpendre. A cobertura em duas águas perpendicular à
rua é feita com telhas do tipo marselhesa. Internamente a casa tinha assoalhos
de pinho de Riga e barrado pintado em marmorizados. Hoje apresenta acréscimo
posterior, além do referido alpendre. Havia ainda um velho portão de ferro
batido assentado em pilastras de alvenaria e pequena ponte sobre um rego que
passava próximo ao portão. O Padre Joao Batista da Fonseca, foi presidente da
Câmara e agente executivo em Tiradentes por volta de 1915, quando se inaugurou
o abastecimento de agua canalizada na cidade; posteriormente foi capelão da
ordem 3° do Carmo de São João Del Rei.
Outro exemplar sobrevivente data de 1925 e foi construído para
residência do português Estevão Martins que aqui aportou nos anos de 1920, se
casou deixando logo depois a família e retornando a Portugal, segundo dizem,
por ter contraído muitas dívidas. A casa passou para domínio de um banco e
pertenceu depois a Francisco Lucinda e a seu genro Pedro Ferreira Barbosa,
atualmente propriedade de Vanilce Barbosa.
Fotografia de Estevão Martins, 1920,
construtor da casa acima, acervo particular
Construída com planta em retângulo perpendicular à rua, assim como a cumeeira
sendo a cozinha em corpo anexo, mais baixo. A cobertura em duas águas é de
telha do tipo marselhesa, com beirais em ponta de caibros e proteção em tábuas.
A entrada se faz por porta lateral acessada por três degraus de cimento em
semi-circulo. As janelas laterais verticalizadas perderam-se todas. O que se
mantem integro é a fachada com embasamento alto chapiscado, com aberturas de
ventilação gradeadas. Dois Cunhais em relevo sustentam a cimalha perfilada, que
enquadra quatro janelas verticalizadas, com folhas de calha e caixilhos de
guilhotina. As molduras das janelas são de argamassa, com sobrevergas alteadas
sobre pequenas mísulas ou modilhões fitomorfos. Sob as janelas aparecem
almofadas com as quinas quebradas em quarto de círculo. Sobre a cimalha
apoia-se o frontão ou empena curva tripartida decorada com molduras e a coberta
de telhas capa e canal, tendo nas extremidades duas pinhas de cerâmica. Ao
centro havia uma águia, hoje desaparecida. Ainda no frontão aparecem relevos de
balaustres na parte inferior e ao centro com um brasão de armas da república
brasileira (estrela com círculo azul ladeadas por ramos de café e fumo. Aos lados eqüidistantes,
aparecem as iniciais do construtor E.M. (Estevão Martins) e a data de 1925.
Originalmente havia um portão de ferro lateral, com as mesmas iniciais
na parte posterior, assentado em pilastras com dois leõezinhos de cerâmica e a
direita um falso portão em cujas colunas haviam pinhas. O interior era
assoalhado de tabuas estreitasas (20 ou 25cm) e no hall de entrada, sala
frontal e quartos havia uma barrado pintado à imitação de mármores coloridos
com desenhos de almofadas.
Hoje a casa acaba de passar por restauração e adaptação para comercio,
após longo período de degradação.
Na mesma rua, logo abaixo, no caminho da estação existiu até a década de
1980 a casa de Francisco Ferreira de Morais, o Chico do Cesáreo e de Jeny
Morais Batista, onde havia armazém de secos e molhados e casa de vivenda. Esta
construção tinha duas portas na frente e uma janela. A entrada da residência
fazia-se pela lateral, através de um alpendre com pinturas de paisagem na
parede. A janela dava para sala de visitas e as portas para a varanda. A empena
da fachada tinha recortes, relevos e almofadas e terminava em curvas com três
pinhas de cerâmica. A
esquerda ficava o armazém ou deposito de gêneros alimentícios, com telhado
paralelo a rua e janelas tradicionais. Tratava-se de uma casa antiga,
possivelmente do século XIX que teve a fachada reformada ao gosto dos anos
1920.
A Estação da Estrada de Ferro Oeste de Minas (EFOM) foi construída por
volta de 1880, sendo inaugurada em 28 de agosto de 1881. A edificação original
era menor que a atual, pois só existia o antigo armazém e a agência que hoje
fica no centro do prédio. Os dois cômodos à direita parecem que foram
acrescidos ainda no século XIX e a área de cozinha e dispensa (hoje banheiros)
já no século XX. O prédio segue o mesmo estilo das estações com telhado em duas
aguas com telhas francesas, duas empenas com óculo e cimalhas. Os beirais todos
contornados por lambrequins de madeira recortada, hoje em parte perdido. O embasamento
em pedra é alto devido as enchentes do Rio das Mortes. Portas e janelas são do
tipo calha, com caixilhos de grandes vidros, com molduras de massa no terço
superior. Há barrado de chapisco voltado para a plataforma. Esta é acoplada a
casa com piso de cimento liso, estrutura de trilhos, telhado em duas
aguas, originalmente de telhas de barro francesas, hoje substituído por telhas
vermelhas de amianto em losangos imitando telhado de ardósia. Um jardim típico
dos anos 1920 foi acrescido ao conjunto. A arquitetura das estações influenciou
sobremaneira as reformas e novas construções, com empenas voltadas para a rua,
molduras de massa nas portas e janelas e lambrequins nos beirais.
Estação de Tiradentes foto de 1920, ainda com
os lambrequins na empena do telhado principal
No Largo das Forras existiu uma curiosa construção dos anos 1920/1930 em
terreno originalmente logradouro público, onde hoje é a Pousada do Largo, n° 48.
A casa tinha um curioso jogo de águas de telhado e portas e janelas em arco
pleno. Inicialmente propriedade de Francisco Araújo Lima, depois Domingos
Longatti e ultimamente passou à Lourenço Firmino de Campos quando
foi reformada e o telhado foi refeito em duas aguas. Mas de qualquer maneira a
construção tinha influência do ecletismo.
Entre 1938 e 1942 foi construída uma casa de Teófilo Reis na atual Rua
dos Inconfidentes n° 211 cuja fachada de influência eclética e de
gosto popular foi pintada de verde e amarelo como a bandeira do Brasil. Duas
janelas com molduras de massa e caixilhos de grandes vidros preenchem a frente.
A porta de entrada é lateral precedida de alpendre.
Sob as janelas há uma grande almofada de massa. Dois cunhais sustentam
uma cimalha estreita perfilada e frontão em dois semicírculos com relevos de
leques encimados por agulhas de cerâmica. No centro do frontão há uma peanha e
coifa metálica onde havia a figura de cerâmica de um índio ligado a Umbanda e
sobre a entrada do alpendre nicho com as figuras de Pai João e Mãe Maria,
também da Umbanda. As iniciais do proprietário e as datas estão em relevo no
frontão, como divisa “Vila fé em Deus”. Esta casa de gosto popular
se manteve integra externamente, com exceção das figuras de umbanda,
desaparecidas.
Sobrevive ainda na rua Antônio Teixeira de Carvalho n° 113 a casa
construída por Joao Gonçalves de Moura, nos anos 1930, do tipo bangalô, com
empena simples, alpendre embutido no corpo da construção.
O muro baixo com faixas em relevo dão charme a construção, com pequeno jardim à
entrada.
Na cidade não existe e parece que não existiu construções de gasto “art
décor” com exceção de duas sepulturas no cemitério da Matriz, da família de
José Cândido da Silva. Houve ainda um pequeno portão de ferro n primeira casa
da Rua Silvio de Vasconsellos, pertencente ao Antônio Gonzaga Teixeira (o
Canarinho) hoje de Eros Grau. O portão foi retirado e está desaparecido.
Um curioso exemplar de arquitetura popular modernista sobrevive na rua
dos Inconfidentes n° 317, de Nilber Barbosa. A fachada com colunas copiadas dos
palácios de Brasília, grandes panos de vidro e telhado de laje plana, com
platibanda em ângulo central que remete a linguagem modernista e incorpora
revestimento em pedra da Serra de São José, muito usada nos anos 1960 e 1970,
para revestimento decorativo.
Fora do núcleo urbano podemos citar a estação de trem de Cezar de Pina e
as casinhas adjacentes, a primeira construída em 1923, no eclético típico das
estações. Existiu ainda a bela estaçãozinha de Águas Santas, demolida em 1966,
que tinha empenas de ferro ou madeira recortada e paredes de “enxaimel”.
No mesmo povoado de Águas Santas duas construções de apuro ligam-se ao
ecletismo: a capela de Nossa Senhora da Saúde inaugurada em 1915 e o prédio do
balneário construído por volta de 1908/1910, com portadas em arcos de volta
inteira. A capela está totalmente descaracterizada e o balneário foi demolido
para construção de novo prédio na década de 1960.
Ainda na região da “Caixa d’água da Esperança” pode-se ver ainda a casa
de David Silveira, com frontão eclético e cimalhas perfiladas. Ainda nessa
região existiu o chalé da Baronesa de Santa Maria ou fazenda da Esperança,
construído por volta de 1860/70 em estilo neoclássico/eclético, com fachada apresentando
frontão triangular, três ou quatro janelas rasgadas com sacada entalada,
entradas laterais com escadas de pedra e gradil de ferro. O embasamento era
alto e casa possuía um pátio interno, do tipo jardim de inverno. Infelizmente a
casa foi demolida no início da década 1980 e o material vendido, sobrevivendo
apenas os alicerces. Enfim há ainda alguns exemplos de inicio do século XX,
tanto nas Águas Santas quanto na zona rural do município.
Justo o que eu procurava sobre corrimão de ferro e serralheria bh. Muito obrigada!
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